segunda-feira, 11 de outubro de 2010

A Aids no Vale do Aço

A cada três dias, uma pessoa é infectada com o vírus HIV

e o número continua crescendo

Num dia de atendimento aos soropositivos, uma senhora acabou de sair da sala do psicólogo, que orienta soropositivos e seus familiares. Era uma mulher que aparentava ter uns 63 anos. Tinha os cabelos grisalhos, usava roupas humildes e segurava uma bolsa pequena e simples. Ao sair daquela sala, esta senhora pisou na recepção do Gasp com os olhos inchados. “Quantos anos ele têm mesmo”, perguntou a secretária, que também se encontrava lá. “Meu filho têm 32 anos”, respondeu em lágrimas.

Naquele momento, o presidente da entidade saiu de sua sala e, entregou-lhe algumas passagens de ônibus municipais. “Obrigada, eu vou para o Hospital. Vou ficar do lado dele, até que tudo isto se acabe”, ressaltou a senhora. Ela olhou para o repórter de uma maneira que ele podia saber o que estava pensando. A senhora pegou em sua mão direita e disse solidariamente para que ficasse com Deus. Após sua saída, o repórter imaginou que ela achou, que ele era um soropositivo, porque estava sentado na recepção do Gasp, esperando o presidente para realizar a entrevista.

A história

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), o primeiro caso de Aids no mundo foi em 1959, na África. Foi neste ano, que após a morte de um homem em Congo, detectou-se a presença do vírus HIV no organismo. Este exame foi realizado devido a deflagração da epidemia no país.

Nos anos 80, um fato historicamente novo se apresentou no mundo: a epidemia da Aids, e no final desta década, os primeiros casos foram diagnosticados no Vale do Aço. Como nesta década os medicamentos não tinham tanta eficácia como os que são usados em pacientes soropositivos, algumas destas pessoas infectadas pelo vírus, se uniram pelo desejo de continuarem vivendo, e criaram o Grupo de Apoio aos Soropositivos – (Gasp).

Este grupo é uma Organização Não Governamental (ONG), atende aos soropositivos do Vale do Aço. O Gasp é um grupo dedicado ao convívio com a existência do vírus HIV. Desenvolve ações de assistência as pessoas soropositivas e seus próximos, visando o combate aos preconceitos, a inclusão social e a busca por melhor qualidade de vida. Realizam também um trabalho de educação continuada em escolas, empresas, organizações sociais e grupos específicos, no sentido de prevenir a infecção pelo vírus HIV.

De acordo com Thiago Emiliano Garcia, presidente do Gasp, a doença atinge pessoas de todas as idades e classes sociais. Ele salienta que a maioria das pessoas que fazem parte do grupo de apoio, são da classe baixa. “A maioria das pessoas de classe média e alta, que foram contaminadas pelo vírus HIV, procuram tratamentos em outras cidades para não se exporem por medo do preconceito. Eles não querem aparecer, por terem medo de serem mandadas embora de seus empregos”, ressalta.

Ele explica que a partir do momento que a carga viral dos soropositivos, estejam com o número elevado, entra a medicação. “Se no exame acusar a presença do vírus, não significa que o soropositivo terá que usar os medicamentos”, acrescentou. O presidente aconselha a todos que foram infectados pelo vírus HIV a aderirem ao tratamento, por ser o único respaldo que as pessoas têm. “Os remédios têm efeitos colaterais, mas sem eles, o vírus pode destruir toda as células de defesa”, alerta.

Situação Alarmante

Mesmo com tantas campanhas de combate a Aids, divulgadas pela mídia e por vários grupos de apoio aos soropositivos, o número de casos aumentou no Vale do Aço. De acordo com o Ministério da Saúde, até dezembro de 2003, foram notificados 360 nesta região. Não é de hoje que este assunto rodeia este Vale, que além de ser o polo do Aço, está se tornando o polo da Educação e atraindo centenas de estudantes de todo o Brasil.

Ivanete Araújo de Souza, coordenadora do Programa DST/Aids em Timóteo, explica que este número aumentou porque as pessoas estão praticando sexo sem preservativos e, estão usando drogas injetáveis. Ela aconselha pessoas que têm um comportamento de risco, isto é, que estejam mantendo relações sexuais sem a camisinha, a fazerem o exame de três a seis meses após o ato sexual.

A coordenadora explica que este tempo é devido ao período de Janela Imonológica, que pode transmitir o vírus da Aids, como também pode não ser detectado pelo exame. “Pode dar um falso negativo”, diz.

O Ministério da Saúde - MS, informa que em Dezembro de 2003, foram notificados 257.780 casos no Brasil, sendo 185.061 homens e 72.719 mulheres. Nesta pesquisa, foi constatado que 86,2 % são infectadas através do ato sexual e 12,4% no uso de droga Injetável. Já nos homens, 58% aparecem com o vírus após a relação sexual, sendo 21,7% entre os homossexuais; 11,4% nos bissexuais e 25% entre os heterossexuais. No uso de drogas injetáveis 23,4% destes usuários pegaram o vírus.

Contaminação

Por medo do preconceito da sociedade, Ivanete Marcela Carvalho, usa este pseudônimo para falar como foi contaminada com o vírus. Aos 41 anos, ela luta contra a manifestação de doenças desde seus 30 anos, quando foi contaminada através do parceiro, em sua relação sexual. Seus familiares não sabem da sua condição de soropositivo. Ela resolveu não se abrir para não ser discriminada por ser portadora do vírus HIV. “Quando me descobri soropositivo, imaginava que não viria meus filhos crescidos, muito menos viveria para ver meus netos. Hoje tudo é diferente! Tenho netos”, destaca.

Ela ainda diz esperançosa que acredita que a medicina consiga a cura para este vírus. “Tenho trabalho, sou útil, e ajudo muito as outras pessoas com minha lição de vida”, ressalta. Ivanete acha excelente o apoio que o governo dá aos soropositivos. O que lhe deixa chateada é “o preconceito da sociedade por não saber realmente sobre o assunto” avalia.

Já o jovem de 26 anos, que usa pseudônimo de Carlos Alberto Goulart, prefere preservar sua identidade, por que acha que sociedade “têm muito preconceito, por falta de informação”, diz. Foi aos 24 anos de idade, que descobriu que foi infectado pelo vírus através de relação sexual. O rapaz acha que pode viver entre 15 e 20 anos sem manifestar nenhuma doença. “Têm pessoas que conheço, que nunca adoeceram e têm este perfil”, informa. Ele ainda diz que o apoio do governo deixa a desejar, devido a precariedade do sistema de saúde.

Após uma relação sexual desprotegida, há nove anos, Carmem Maria Silva, 31anos, escolheu este pseudônimo, para preservar sua identidade, pensando no grande preconceito da sociedade. A portadora do vírus, ainda diz que sua relação com os familiares não foi abalada. “Todos sabem da condição de ser soropositivo e não sofri preconceito nem discriminação dentro de casa”, informa. “Tenho uma força muito grande em viver, sou uma lutadora e depois que me descobri soropositivo, muitas coisas boas aconteceram na minha vida”, destaca. Carmem acha a sociedade “muito preconceituosa por medo do desconhecido, e por muita falta de informação”.

Discriminação

Publicado pelo jornal Diário do Aço, no dia 09/04/2004, a ipatinguense Cláudia Maria Silveira Mota, 31, entrou com uma ação no Juizado de Pequenas Causas de Ipatinga, contra Manoela Martins de Medeiros, proprietária da Academia Aquática, no bairro Jardim Panorama, porque foi orientada pela mulher a trocar as aulas de hidroginástica pela aeróbica.

Isto, porque outros alunos da academia estavam incomodados em participar das aulas na piscina, junto com uma soropositivo. Cláudia se sentiu discriminada. E disse a Manoela, que iria cobrar seus direitos. Para tentar contornar a situação, a proprietária da academia procurou Cláudia e disse que ela poderia frequentar as aulas de hidroginástica no quadro de alunos especiais como diabéticos, idosos e grávidas.

Sugestão novamente recusada e considerada uma discriminação. Cláudia, com o apoio do Gasp, acionou a justiça. “Não estou preocupada com dinheiro, estou brigando não só por mim, mas por outras pessoas que podem passar pela mesma situação”, explicou.

Mistério

O presidente do Gasp informou que um casal do Vale do Aço, (ele não revela a cidade e nem o sexo da criança para evitar o preconceito, visto que o filho de aproxima da idade estudantil) teve um filho. Este casal não é soropositivo. Só que o bebê nasceu num hospital em Belo Horizonte, com o vírus HIV. Diante deste fato, eles fizeram outro exame para verem se eram soropositivos e o resultado novamente deu negativo.

Após fazerem outro exame no filho, constataram que a criança estava com com o vírus da Aids. Desconfiados de que o bebê foi trocado na maternidade, eles fizeram um exame de paternidade, e constataram que filho é mesmo do casal. O que os deixam intrigados, é saber como o bebê nasceu com o vírus, sendo que após o nascimento, os pais afirmam que a criança não teve mãe de leite e não sofreu abuso sexual. Diante deste fato, o casal está processando o Hospital da capital mineira.

Alerta

Irisnett de Souza Andrade, coordenadora do Programa DST/ Aids em Ipatinga informa que a Aids não se manifesta da mesma forma em todas as pessoas, depende de cada organismo, além disso, os sintomas podem demorar até dez anos para aparecerem. “Não adianta ficar esperando por um sintoma da Aids para fazer o teste” ressalva. Na sua opinião, o melhor é ficar sabendo se tem ou não o HIV e não abrir mão da camisinha e nem compartilhar agulhas e seringas.

A coordenadora diz que se o resultado do exame for positivo, a equipe de aconselhamento do posto de saúde estará dando assistência psicológica, médica, nutricionista e farmacêutica ao paciente.

O Programa DST/ Aids é realizado pelo Ministério da Saúde. Em Ipatinga, a assistência aos soropositivos é na Unidade de Saúde da Cidade Nobre – UISA, na Av. Monteiro Lobato, 816, bairro Cidade Nobre. Tel. (31) 3846-7714.

Em Cel. Fabriciano, a assistência é no Posto de Saúde Santa Terezinha, Rua 21, s/n – Santa Terezinha; tel. (31) 3846-7714 e em Timóteo, no Centro de Especialidades, rua Ana Moura, s/n, bairro Timotinho. Fone (31) 3847-7624.

O Gasp funciona de segunda á sexta-feira, na Av. José Júlio Da Costa, 1.240, no bairro Iguaçu, em Ipatinga.

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